Hoje eu gostaria de escrever para a pessoa mais importante da minha vida: eu mesmo!

E falar com o André de 4 anos que elu foi muito talentoso costurando o peixinho de retalhos alinhavando cada ponto, um a um, e que a memória dessa obra de arte me inspira até hoje em muitas coisas que eu produzo!

Ao André de 5 anos, que a boca mais vermelha realmente deixa a gente muito sexy! Que odiar a fase que a mamãe só comprava batons marrons e dourados é até hoje compartilhada como a pior de todas! Que usar os batons da tia Beth – os mais vermelhos e rosa – me fizeram hoje amar minha boca mais vermelha e coloridinha! Obrigade, meu anje! Você foi e sempre será o melhor dançarino de É o Tchan que nossa geração já teve!

Ao André de 6 anos que descobriu que a boca do primo era mais legal de beijar que a da prima e pediu ele em namoro no banheiro do colégio... Sério... eu nem sei dizer como você é corajose... como você foi fundamental para o nosse desenvolvimento afetivo e sexual. Como a sua coragem nos trouxe até aqui!

Dé de 7 anos, meu número da sorte, quando você descobriu que 7 eram as cores do arco-íris e ganhou a festa dos seus sonhos: pintando o 7! O seu sorriso nas fotos desta festa são espetaculares, o seu dom de colorir o mundo sorrindo, é o André que mais me visita, mais me toca até hoje... Porque nós continuamos apaixonados por arco-íris e cores... Quero te agradecer por me fazer acreditar que o arco-íris é sim um presente de Deus pra gente... Hoje, mais maduro eu vim aqui te dizer: É mesmo! É Deus sim! É Deus em luz e em cores! E sempre foi pra você todos os que você via! Só você via aqueles arco-íris do seu jeito, sabendo que era Deus falando com você! Obrigade... sem você eu seria preto e branco.

Ao André de 8 anos, eu sinto muito por termos enfrentado tanta dor juntos na escola... Obrigado por você começar nossa coleção de papéis de carta... Obrigado por você ter se dedicado a aprender a fazer bijouteria e nos ter dado a oportunidade de enfeitar tanta gente pelo caminho, por ter feito a gente ganhar tanto dinheiro pra comprar as coisinhas que a gente queria... mesmo que fosse secreto... eu me orgulho muito por você não ter desistido quando te diziam que era coisa de menina... Hoje bordamos nossas roupas, fazemos nossos acessórios, bolsas... e até ganhamos grana com isso, tá? Acho que você gostaria de saber disso!

Ao André de 9... Sim... O Rodrigo Santoro é o nosso crush master até hoje! Não tenho mais aquele pôster dele, mas prometo que irei providenciar um... pra gente contemplar juntes, ok?

Deco... o de 10, 11,12 e 13,14 e 15  anos... Bem... a gente passou muito tempo vivendo vidas secretas né? A gente sabe que sempre gostou de ser notade onde a gente chegasse... e nessa época recebemos tanto ódio... tanta raiva... dos outros... porque éramos felizes mesmo sem nos permitirem... O nosso silêncio foi importante também... Eu já agradeci pessoalmente ao nosso primo Douglas, por todo colo e amor que ele nos deu quando a gente estava desabando... E sim... nós hoje usamos saia! Cropped! Salto! Tudo que a gente pensava que um dia poderia fazer! Dé de 14 anos, obrigado por não ter desistido de viver... obrigado por ter segurado a onda mesmo com tanto medo... Hoje nós protegemos crianças... Falamos dessa experiência onde a gente passa... contamos sobre isso e sobre o cuidado com as crianças queer... Nossa história hoje serve de escudo pros outres pequenes que estão crescendo. A ideia do blog foi genial! Li e reli nossos desabafos diversas vezes este mês... Como você escreve bem! Como você consegue tornar sentimentos tão difíceis em textos tão lindos. Não vou parar, estou tentando recomeçar!

Bicha! Você foi muito forte! Dé de 16... a sua decisão mudou toda a nossa vida! Você estava certo.... não dava mais pra fingir ser quem não se é... Não tivemos opções viáveis ali! Aquilo que estávamos sentindo quando encontrávamos mamãe chama-se angústia... por isso nós ficávamos tão frágeis, fracos... e desabávamos... Obrigado por se reerguer, por levantar a cabeça e mesmo com tanto medo ter dito a ela que nós não éramos tão parecides com os outres... Por ter insistido nos nossos sonhos... Por ter ocupado todos os espaços vazios com os cursos mais aleatórios que poderiam aparecer... Hoje eu posso te dizer que nada foi em vão... Sabemos tanto sobre tanta coisa... as pessoas se atraem por nós porque falamos de moda, de sexo, de política, saúde, militância, carros, bolsas, cabelo, esportes, até petróleo e gás quando necessário! Esse investimento foi tão importante... você é foda!

Dé de 17, tão sensual e sexual, né? De repente o  mundo todo aos seus pés... os homens... as mulheres... e você ali dançando... e vivendo cada uma daquelas oportunidades... eu lembro bem como passamos a deixar de ter medo de sexo e começamos a vê-lo como algo bom e que podia ser sentido... Não... não era egoísmo quando você não queria penetrar os meninos... Não se culpe por não ter cabido nos moldes que você aprendeu naquela época, hoje somes livres... a gente mal usa o pau, tá ligade né?

Dé de 18... a gente precisa sentar pra conversar... a gente precisa fazer as pazes logo, não somos culpades de nada que vivemos. Concordamos que as escolhas que fizemos para que o grande amor da nossa vida ficasse supostamente feliz e os traumas que esse período trouxeram nos endureceram muito... nos violaram e nos violam até hoje... eu quero porpor que a gente se perdoe por isso, que a gente lembre também de quando saímos do regime do quartel e fomos pro shopping e o Jean – o homem mais lindo de vila velha – arriscou o emprego pra pedir seu telefone.... Precisamos lembrar também de quando fomos um grupo forte e ROSA na chapa do grêmio estudantil... Eu falo com nossos amigos até hoje... Ah! Hoje o título de senhora silva, que recebemos quando começamos a ser “a namoradinha” do 98, o cara “hétero” mais gostoso da turma... que vivia preso no quartel por má conduta e acabou se  deliciando com o que ele mesmo dizia “pernas de garota”... Hoje a gente tem chamado de Andy... e tem sido muito mais legal!

Depois d